domingo, 30 de dezembro de 2012


Ela não o via há cerca de um mês. A ausência dele foi apagando seu rosto da memória dela. Ela tentava lembrar seu cheiro. O cheiro do cabelo dele. No último dia, sabendo que seria o último, ele deitado ao lado dela, dormindo, ela cheirou seu cabelo, sua pele, queria guardar o cheiro, como uma essência... Mas o rosto dele se misturava. Era vago. As fotos não a faziam lembrar-se dele, eram como um quadro de alguém que nunca existira na vida dela. Ela queria lembrar a voz dele...não conseguia. Nos sonhos ele aparecia mas não era a voz dele, era a voz dela, falando por ele. Mas o cheiro do cabelo dele, esse ainda persistia... última lembrança à qual ela se agarrava. Eles ainda se falavam esporadicamente, ele sempre monossilábico, ela querendo contar do seu dia-a-dia, queria tornar-se novamente interessante para ele... até que desistiu. Havia uma certa promessa de se reencontrarem mas ela não confiava nisso. E como não confiava, os pensamentos de sair com outros homens persistiam. Ela procurava, flertava, não levava adiante, mas cada vez mais se convencia que devia isso. A ausência dele, as poucas mensagens, tudo a levava a procurar outro, pois ele não a queria mais, não se importava. Não que ela realmente quisesse, só não queria esperar por ele. Urgenciava encontrar outra paixão. Esquecê-lo. Como uma mandiga, pensava, se ela estivesse com outro, alguma energia cósmica o avisaria e ele retomaria o interesse por ela, movido pela competição, desconfiando, sentindo que ela o esquecera.

Ela precisava achar outro, não era difícil, desde que ela se empenhasse. Já fizera isso outras vezes, apesar de estar há muito tempo quieta, sozinha, de haver desistido, mas isso foi antes de conhecê-lo. O desejo que ele despertara nela, também a despertara. Ela não queria mais voltar ao estado de solidão que esteve por anos. Ela ia atrás de alguém, fingir interesse, fingir que ouvia, os homens gostam de ser ouvidos. Iria mostrar interesse e se retirar, como fez com ele. O interesse se mantinha até o momento em que ele sabia que ela já era dele... sempre foi assim. A partir desse ponto, eles sempre perdiam o interesse por ela. Então ela iria ficar para sempre nessa etapa. Quando ela começasse a se interessar realmente, deveria cair fora. Esse ponto, esse timing, ela teria que aprender a usar. Nem um dia a mais, nem uma ligação a mais, não responder as mensagens deles. Sumir. Quando ela se interessasse novamente por alguém ela teria que fugir. Essa talvez fosse a parte mais difícil, porque sempre havia a esperança que dessa vez ele manteria o interesse, ele realmente a amaria. Mas como disseram, na idade dela o que era amor¿ Como ela ainda pensava em se apaixonar¿ Há um mês atrás ela achava que havia encontrado finalmente, ela queria viver isso, ela nunca vivera.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Montanhas

 
 
Eu gosto das montanhas. Eu gosto de saber que elas estão lá.
Não tenho a pretensão de escalar, de subir, eu só gosto de olhar para elas.
As montanhas me dão segurança.
Se eu subir e chegar ao topo da mais alta de todas, eu não verei mais as montanhas, verei um horizonte. Verei o local onde estou agora e isso me trará solidão. Eu quero ver as montanhas.
Eu quero saber que elas sempre estarão lá. Que me observam, me guardam. Eu nasci para contemplar. Para esperar.

domingo, 18 de novembro de 2012

Mundos Paralelos

Pela teoria dos mundos paralelos, ou IMM (Interpretação de Muitos Mundos) de Hugh Everett, vivemos várias vidas, milhares talvez, cada possibilidade de decisão abre caminhos diferentes e cada desfecho possível é uma nova linha de vida... o que me faz pensar se estamos vivendo nossa melhor decisão ou existe um outro eu aproveitando mais do que eu???

 

domingo, 11 de novembro de 2012

Férias

Desde criança minhas férias tem um que de vida paralela, como se por um período de tempo, eu me transportasse para uma outra dimensão. Posso dizer que na maioria das vezes essa outra vida é mais feliz, apesar que nem tudo sempre funciona de acordo e percalços ou tristezas também acontecem.
Estas últimas férias não foram diferentes e mais do que em outras, a sensação de vida paralela estava presente. Tão presente que eu cheguei a querer desistir desta vida e ficar na outra.
Foi um mês viajando, em cada cidade que passei, vivi uma vida diferente. Foram praticamente 5 vidas. Tantas memórias...
 
E em todas as férias eu trago amuletos, não são amuletos de pendurar no pescoço ou carregar na bolsa, se bem que trouxe alguns souvenirs... mas estes apesar de me lembrarem da viagem não me dão aquela sensação de dejà vú, de ter ter vivido uma outra vida.
Já vivi férias, há muitos anos atrás,que meu amuleto foi um Disco de vinil, chamado Ritorna, com músicas românticas italianas, antigas... que tenho até hoje e me transportam para aquele período, aqueles sonhos de menina...
Coincidência ou não a Itália esteve muito presente nestas férias, de um jeito ou de outro, lá estava ela,talvez em forma de aviso ou premonição.
 
Dos meus amuletos de viagem, um que sempre marca, é o perfume que usei naquela temporada, cujo cheiro evoca à memória. Sempre uso um diferente que fica marcado como o perfume da viagem. Teve uma vez que foi um desodorante Rexona mas foi uma outra história ou foi em outra vida... Nesta deixei para comprar um lá, assim a memória seria só desta vida.
Nesta viagem o perfume foi o Guess Seductive que comprei baratinho em uma farmácia de Viena, e que viveu comigo muitas emoções depois.






Outro amuleto foi o doce Nutella, eu já havia comido, mas ele foi personagem de algumas histórias nesta vida: ele apareceu em Paris na forma de um genérico, e me salvou de uma crise de TPM, também dentro de um crepe francês em frente à embaixada dos EUA, depois em sachês no café da manhã do B&B de Verona e finalmente, junto com uma panqueca de reconciliação que um italiano fez para mim em Londres... doce Nutella ...
Também nunca mais um simples penne vai ser o mesmo, seja à Carbonara ou com Salciccia..
E a chuva... a garoa... ou como aprendi do cockney londrino spitting... ficou a lembrança da garoa intermitente de Edimburgo...
Os carrosséis de Paris... girando e girando e me levando de uma vida à outra... e também novamente girando em Viena...
Jack the Ripper seja no Prater de Viena ou na lembrança do bairro de Whitechapel onde me hospedei.
Ficaram como amuletos: meu gorrinho bege de pompom, minha bota e jaquetas forradas, meu cachecol de lã...
Também marcaram os filmes: como o novo 007, Skyfall, em cartazes espalhados por toda a parte. Ou os filmes disponíveis no avião como: "Branca de neve e o caçador", "O Exótico Hotel Marigot", "Your sister's sister", "Sombras da Noite"... ou o "Hobbit" no livro que comprei...
Um jogo de futebol... uma estação de metro onde cheguei, passei e me despedi várias vezes e os famosos kebabs, que estavam por toda a parte, em todas as cidades... e me salvaram de fomes noturnas...

 
Ficou a lembrança de vidas que vivi e em algumas, como em um filme  que eu gostaria de mudar o final.... ou ver de novo...

domingo, 23 de setembro de 2012

Ele.2

Às vezes a perda vem antes mesmo de tudo começar, com ela é assim, sempre foi.
Ela espera perder, ela não ganha, ela não percebe o durante, só pensa até quando?
Mas não é mesmo? Ela não esperava ganhar quando o conheceu, ela já sabia que iria
terminar, porque começou? Porque os começos são bons, os começos criam expectativas e
sonhos. Aquela vidinha cheia de hífens e espaços entre os parágrafos se preenche, seus
minutos são cheios, seus segundos não passam... ela existe entre antes e depois de vê-lo,
ouvi-lo, de uma mensagem. A sua vida é suspensa, ela não é ela, sua concentração principal
muda de foco, mas isso não dura. Logo vem a certeza, cheia, plena, absoluta do final.
Ela não estava triste por terminar a relação, ela estava triste por ter começado, por ter falhado,
porque ela sempre soube que ele era step, ele não era pra ser. Ela mudou quando estava com
ele e isso era o sinal que ela não agüentaria muito tempo.
 
Ela não percebeu que estava em frente de uma arara de roupas, dentro de uma loja cheia de mulheres, as roupas
na arara diziam tamanho 52 e acima dela, na parede, fotos da Beth Ditto, linda, sexy.
 
Ela saiu da loja, para a rua movimentada novamente, foi para casa. Não acendeu as luzes, sentou no
sofá e ligou a tv, ficou olhando a tela hipnotizada, os filmes passavam, ela não percebia. Não fez nada, ficou ali, dormiu e acordou e já era noite. Estava sem fome, olhou no celular, ele não ligara como ela previra, nem mensagem.
 
Ele não tinha facebook, então não havia o que conferir, mas ela pensou, o que estava fazendo? Porque isso a incomodava tanto já que ela sabia que iria acontecer? Queria chorar, mas não haviam lágrimas, só uma calma pesada.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A Porta


Os gritos dela ecoavam pela casa. Ecoavam nos seus ouvidos. Dor. Desespero. Morte. Você não conseguia se livrar deles, mesmo depois do fim, os gritos ainda se ouviam por todos os cômodos. Então, a agonia terminou. Acabou. Mas ninguém disse que o final se estendia indefinidamente... e os gritos ficaram cravados na memória das paredes, da cama, na porta fechada, branca, impassível. A porta do julgamento. Dizendo o que voce não fez. Quando voce não esteve. Atrás daquela porta toda dor, toda agonia ainda existiam e você não fez nada. Você não estava lá. Mesmo ao ouvir os gritos, o desespero, aquilo doía em você tanto quanto nela mas entrar por aquela porta, não, você não suportou. Agora se resigna na própria covardia e vergonha. E a culpa, essa companheira invisível, você carregará para todo o sempre. Mesmo que o sempre tenha um fim.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Ele


O  outono a fazia lembrar de antigos amores, ou melhor do fim de antigos amores, aqueles que começam no calor e que não resistem às primeiras brisas geladas...e ela sabia que este não era diferente, deitada ao lado dele, olhando a claridade que amanhecia no quarto. Ele dormia, o corpo magro deitado de costas, dormia o sono embalado pelo vinho da noite anterior, um vinho barato que ele comprou no mercado a caminho de casa. Ela sabia que o relacionamento estava no fim, ela sentia as mesmas inquietações de outras vezes, ela sabia que ele ia terminar com ela, talvez não hoje, amanhã, semana que vem... ela podia terminar isso logo, levantar, vestir-se e sair sem falar nada, ele talvez nem notasse, talvez sentisse falta... acharia estranho, quem sabe ela se tornaria misteriosa, despertaria nele um novo interesse. Mas não, ela se levantou e foi até o banheiro, ficou lá por algum tempo pensando, invadida por uma espécie de tédio desconfortável. Voltou ao quarto e decidida começou a arrumar suas coisas, não ia sair furtivamente, iria dar um até logo e seguiria sozinha para sua casa, sem explicações, talvez em casa a sensação de sufocamento, de ansiedade passasse. Ele ligasse a querendo de volta.

Ela está de costas para ele, ouve ele se mexer, vira-se e ele está sentado na cama, acordando, pergunta onde ela vai?
- para casa.

- aconteceu alguma coisa?

- não, nada, vou para casa ver umas coisas.
- que coisas? Espera, vamos tomar café primeiro.

Ela pensou, está bem, mais um café juntos. Ele se levantou e foi ao banheiro, ela terminou de se vestir e deixou as coisas que trouxera na véspera arrumadas, prontas para a partida. Eles saíram para tomar café na cafeteria próxima, ela estava sem fome, só quis café, pouco leite, ele pegou o jornal, ficaram assim, sentados à mesa junto à janela, frente a frente, uma vida de distância. As pessoas passavam na calçada, ela perdeu-se olhando o ir e vir lá fora, o dia estava ensolarado mas frio. Ela não pensava nada, só observando quem passava, entrava e saía da cafeteria. Ela não via seus rostos e suas roupas se misturavam, nas cores escuras de roupas de inverno. Era uma terça-feira, depois de um feriado, mas ela não tinha que trabalhar naquele dia, estava de folga, ela tinha planos, com ele. Nada fazia sentido agora. Ele comentou algo que estava lendo, ela não prestava atenção, ele também não notou que ela não ouvira. Ela terminou o café e olhou para ele, ainda lendo o jornal e comendo um pannini de queijo e presunto, com uma mão segurava o pão e com a outra o jornal, lia e comia alheio à solidão dela.
- e então você vai para casa? Ele perguntou de repente, tomando um gole de café e olhando para ela.

- vou.
- por que?

Ela não sabia responder, porque eu quero terminar com você antes que você termine comigo, é  isso. Mas não soube dizer. Ela ia começar a contar algo sobre ir para casa ter uma conversa com a sua irmã que adiava fazia tempo, quando o celular dele tocou. Ele atendeu, era a Raquel, a sócia dele na agência, ela desviou a atenção do que eles estavam falando, algum cliente nervoso, ficou esperando ele desligar.
- olha, já que vc quer ir para casa, eu vou para a agencia, sabe como a Raquel é, ela é ótima com finanças mas não é boa quando precisa lidar com algum cliente mais estressado, é melhor mesmo e eu posso resolver isso com calma. À noite nos falamos então.

- está bem.
Ela não precisou falar, ele não parecia realmente incomodado, parecia aliviado, não... ele não estava mais ali. Se despediram dentro do metro, ela percebeu quando ele olhou a moça sentada em frente que também o notou mas o olhar dela para ele não foi de alguém que se interessava, era repreensivo e voltou à cabeça para o guia que estava lendo. Ele virou para Ela e deu um beijo de leve na boca, disse à noite eu te ligo. Ela sabia que ele não ia ligar. Ela não foi para casa, não foi para casa da irmã, perambulou por ruas e vitrines... esbarrando nas pessoas acelaradas... porque ela estava calma, muito calma.